O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem barrado uma prática comum
de contribuintes: a compensação de valores a receber da Fazenda Nacional com
tributos devidos enquanto ainda tramita processo de execução. A decisão mais
recente, proferida ontem pela 2ª Turma, foi desfavorável à Sadia (hoje BRF).
A questão é importante, segundo o procurador Renato Grilo, da Fazenda Nacional,
porque a Receita Federal não tem condições de identificar todos os casos
semelhantes. “Neste [da Sadia], de valor elevado, acompanhamos. Mas tem várias
empresas que podem tentar fazer isso com créditos menores”, afirma.
A 2ª Turma decidiu que a Sadia não poderia compensar cerca de R$ 200 milhões em
créditos tributários que tem a receber para pagar PIS, Cofins e IPI. Exceto se
a empresa desistir de uma ação de cobrança (execução) que propôs na Justiça
para receber o valor.
A gerente de contencioso tributário da BRF, Paula Aquino, afirmou que este caso
diz respeito apenas ao direito da empresa de obter certidão negativa de débito.
E não poderia tratar do mérito da compensação. De acordo com ela, a
possibilidade de compensação dos valores ainda será discutida na esfera
administrativa.
Apesar da ementa do julgamento tratar diretamente da compensação esse não foi o
pedido da ação, segundo Paula, que vai analisar a possibilidade de entrar com
recurso pedindo esclarecimentos da decisão (embargos de declaração). A PGFN
defende que a decisão impede a compensação.
No caso, a Sadia obteve uma sentença favorável referente a cerca de R$ 200
milhões de crédito-prêmio de IPI a receber, por ter pago o tributo
indevidamente. Para receber a quantia, a companhia ajuizou ação de execução na
17ª Vara do Distrito Federal e, posteriormente, sem desistir dessa execução,
efetuou compensação, deixando de pagar valores de PIS, Cofins e IPI entre 2002
e 2003. A compensação foi referente a cerca de 11 meses, segundo o procurador.
A PGFN defende que a empresa deveria escolher um dos caminhos: ou receber no
fim da execução ou usar o valor em compensação de tributo devido. Para a
Fazenda Nacional, a compensação nesse caso, concomitante à execução, fere a
boa-fé objetiva.
Na decisão, o ministro Herman Benjamin considerou que se o contribuinte optou
pela execução judicial de todo o seu crédito, fica automaticamente prejudicada
qualquer possibilidade de compensação, a menos que a empresa desista da
execução. A discussão é pacífica na jurisprudência do tribunal, segundo o
ministro. A decisão da turma foi unânime.
O mesmo entendimento havia sido adotado pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da
4ª Região. A Sadia pediu, por meio de mandado de segurança, com pedido de
liminar, a suspensão da exigibilidade do crédito tributário e a expedição de
certidão positiva com efeitos de negativa.
Há outras decisões no mesmo sentido no STJ. Em 2012, o ministro Mauro Campbell
Marques, também da 2ª Turma, ao analisar pedido da destilaria Miriri, que tinha
valores referentes a repetição de indébito (tributo pago a maior) para receber,
teve o mesmo entendimento.
De acordo com o magistrado, a pretensão de compensação de créditos reconhecidos
judicialmente requer “expressa desistência da ação de execução”. A desistência
é necessária, acrescentou o ministro, para ser evitada eventual cobrança em
duplicidade. Na 1ª Turma também há decisões com o mesmo entendimento.
Para as empresas, há casos em que a sentença não determina o valor certo,
portanto a execução é necessária para quantificar o valor, segundo o advogado
Maucir Fregonesi Junior, do Siqueira Castro Advogados. Por outro lado,
acrescentou, é uma ação demorada, uma desvantagem em relação à liquidez da
compensação do valor com tributos devidos.
Em disputas de valores relevantes, a ação de execução pode demorar mais de
cinco anos, de acordo com o advogado. “A execução de sentença, que prevê restituição
via precatório, ainda leva um tempo, e não é um valor líquido e certo. Por meio
da compensação, o valor devido já se torna líquido”, disse Fregonesi Junior.
Já a advogada Mary Elbe Queiroz, do escritório Queiroz Advogados Associados,
alerta que a manutenção das duas vias (execução e compensação) poderia de fato
levar à duplicidade de direito.
Fonte: Valor Econômico